Este texto faz parte de uma publicação com um texto introdutório do qual destacamos o seguinte fragmento:
“A edição contou com mais de 230 mil inscrições de professores, de 60.123 escolas, envolvendo assim, mais de 7 milhões de alunos, de 99% dos municípios brasileiros.
A Olimpíada de Língua Portuguesa Escrevendo o Futuro vai além de um concurso: oferece propostas de formação dos educadores, seja nas orientações pedagógicas dos materiais oferecidos, seja na participação em encontros para reflexão sobre as práticas educativas, com o objetivo de aprimorar o processo de escrita dos alunos. Desse modo, pretende contribuir para uma prática pedagógica de melhor qualidade.
Valorizando a interação das crianças e jovens com a realidade em que vivem, a Olimpíada adota o tema ‘O lugar onde vivo’. Assim para escrever os textos, o aluno resgata histórias, estreita vínculos com a comunidade e aprofunda o conhecimento sobre o seu lugar. E isso contribui para o desenvolvimento de sua cidadania.
Esta coletânea reúne os textos dos alunos finalistas da edição 2010 da Olimpíada de Língua Portuguesa Escrevendo o Futuro. Parabenizamos os novos escritores e os seus professores que tão bem apoiaram seus alunos e os ajudaram a descobrir a força que a escrita tem.”
Entre Baldes e Fantasmas
E.M.E.F.PROFª DILZA FLORES ALBRECHT
Sabrina de Souza Rozado - 7ª série
Professora Daniela Correa da Silva
Minha infância foi muito difícil. Trabalhava na roça para ajudar no sustento da família. Nós passávamos por momentos tristes: a falta de comida, roupa e remédios. Naquela época era comum que crianças ajudassem a família e com isso acabavam largando cedo os estudos.
Ah, os baldes! Esses me deram forças... (risos). Tínhamos que caminhar até um rio muito longe para pegar água que servia para nossa alimentação e higiene. Os baldes ficavam mais pesados a cada passo do interminável caminho. Mas, apesar das dificuldades, lembro-me desse tempo com muito carinho: o pedido de desculpas no olhar de nossos pais e os sonhos que tinham para o futuro.
Naquele tempo, o jeito de namorar também era diferente. Recordo que quando conheci meu marido só podia namorar em casa com a vigilância de meus pais. Sabia também que já estava “metida” em compromisso sério, pois não podíamos correr o risco de ficar mal faladas no bairro.
Casei e vim para a cidade “grande” à procura de uma vida melhor, uma oportunidade de emprego. Morei um tempo na cidade de Canoas e, mesmo trabalhando, sofríamos com as prestações do aluguel, pois a família foi crescendo e as despesas também. Então surgiu a oportunidade de comprarmos uma casinha em São Leopoldo; assim vim morar no bairro Cohab. Lembro-me de que quando cheguei aqui as pessoas falavam que este lugar tinha sido um grande cemitério. Alguns moradores ficavam assustados, porque coisas estranhas aconteciam em suas casas. Até hoje, quando contam “causos” de assombração, sempre tem alguém que lembra da história do cemitério e dos tais fantasmas que assombravam suas casas. Fui me apegando a este lugar e enfrentando os fantasmas da vida. Quando relembro São Leopoldo me emociono muito.
Minha casa era pequena e não tinha conforto. Os mercados eram distantes, as paradas de ônibus exigiam longas caminhadas e os horários de transportes eram restritos. Minha história foi se transformando dentro de minha São Leopoldo. Hoje posso dizer que moro no maior bairro da cidade conhecido como “Grande Feitoria”. Há um comércio em cada esquina, posto de saúde e escolas espalhadas pelo bairro. Hoje São Leopoldo nos enche de orgulho com suas riquezas culturais e históricas: Casa do Imigrante, Unisinos, ( Universidade do Vale do Rio dos Sinos), Santuário Padre Reus, e até o trem que aqui já chegou. Claro, o progresso também tem suas consequências. Fico triste quando ouço falar da poluição do rio dos Sinos. Lembro-me dos velhos baldes d’água e da felicidade que temos no simples ato de abrir a torneira. Ao voltar no tempo, penso que mesmo na dificuldade minha vida sempre foi regada por momentos bons. Nesse vale vivo realizada. Sou uma senhora feliz, que entre baldes e fantasmas construiu sua vida.
Peço ao nosso querido Padre Reus que me dê muitos anos ainda para que eu possa seguir crescendo com essa cidade, e quem sabe um dia uma menina querida escreva nossa história.
(Texto baseado numa entrevista feita com a sra. Marinalda da Silva de Oliveira, 57 anos)